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sexta-feira, 17 de junho de 2011

Liberdade

Capítulo 4

Júlia estava pronta. Seu coração batia forte só de pensar na adrenalina que a aguardava. Ela e mais trinta e cinco campistas caminhavam pela trilha que os levaria a um penhasco de mais de cinquenta metros de altura.
A garota jamais vira tantas árvores em sua vida, e olhava para todos os lados, tentando gravar na memória cada detalhe daquele lugar lindo. Não podia se conter, por isso dizia para Chiaki o tempo todo coisas como:
- Chiaki, olha só aquele pássaro!
- Hum, legal. – a resposta de Chiaki era sempre indiferente. A garota asiática morava em uma fazenda de uma pequena cidade não muito longe dali. Nada daquilo era novidade para ela.
- Nossa, isso é tão incrível! – a animação de Júlia por estar naquele novo ambiente excedia os limites do normal, e beirava a ser uma atitude infantil, para qualquer um que olhasse.
- Júlia, a impressão que você passa às vezes é que nunca viu mato na vida. – Chiaki comentou, em tom de brincadeira. Esperou que Júlia dissesse algo, mas ela apenas deu um sorrisinho que Chiaki não soube decifrar. Júlia, é claro, estava pensando que a suposição de Chiaki havia sido praticamente exata.
- Quem será que é esse bendito instrutor de acampamento, hein? – Chiaki resolveu perguntar em seguida, para quebrar o silêncio incômodo que havia se estendido durante alguns segundos.
- Sei lá. Acho que vamos ter o desprazer de conhecê-lo em breve. – disse Júlia, sem imaginar o quão desagradável seria a surpresa que ela teria dali a alguns minutos.
Quando eles finalmente chegaram ao local, a monitora ruiva chamada Bete reuniu os campistas e, depois de fazer algumas considerações e ressaltar a altura exata do penhasco com uma voz alta e animada, anunciou:
- Bem, agora o instrutor irá se apresentar e esclarecer as normas de segurança e as orientações para a prática de Bungee Jumping.
Júlia observou, chocada, quando o garoto que ela conhecera naquele mesmo dia se apresentou.
- Olá galera. Meu nome é Felipe e eu vou instruir vocês na prática de todos os esportes radicais desse acampamento. Hoje, no salto de Bungee Jumping, é importante vocês saberem....
A partir daí, Júlia não escutou mais nada. Estava pensando, indignada, em como um acampamento sério como aquele podia aceitar um instrutor tão irresponsável. Para Júlia, um instrutor dando em cima de suas alunas era uma coisa completamente errada e absurda. Sentiu raiva pela primeira vez desde que chegara naquele acampamento, e sabia que iria acabar descontando aquela raiva na oportunidade mais próxima que aparecesse. Respirou fundo e lançou um olhar acusador para Felipe. Ele apenas sorriu para ela distraidamente e continuou a falar sobre a importância dos equipamentos de segurança.
Júlia se surpreendeu, de repente, pensando no quanto o sorriso dele era lindo. Mais precisamente, no quanto tudo nele era lindo. “Mas, seja como for, isso não vem ao caso.” Ela fez questão de ressaltar mentalmente.
Stefany fez questão de ser a primeira a pular do penhasco, embora tivesse dito naquele mesmo dia que isso era coisa para perdedores. Mas, por mais que aquilo que custasse um cabelo bagunçado, valia a pena tentar uma reaproximação com o instrutor.
- Oi, Stefany. Vai ser a primeira?
- Sem dúvida. Você sabe que eu adoro esportes radicais. É mais uma coisa que temos em comum.
- O que mais temos em comum? – perguntou Felipe, enquanto arrumava o equipamento de segurança. 
- Será que você se esqueceu de tudo que rolou entre a gente, no acampamento passado?
- É... – Felipe não estava gostando do rumo que aquela conversa estava tomando – Acho que sim. E você deveria fazer o mesmo. – disse ele , tentando acabar com aquela conversa.
- Hoje à noite, eu posso passar no seu quarto e refrescar a sua memória, Lipe. – ela falou, em um tom atrevido.
- Não é uma boa ideia. Olha, Stefany... O que aconteceu verão passado ficou no verão passado, tudo bem?
- Você está me dando um fora? – perguntou ela, irritada.
- Os equipamentos estão prontos. Vai nessa! – disse Felipe, se esquivando da pergunta com um sorriso indiferente.
- Escuta aqui, moleque, ninguém dá um fora na Stefany!
- Desculpe, mas eu estou fazendo isso. – retrucou Felipe, se perguntando que tipo de pane dera na cabeça dele para ter ficado com aquela menina, que além de ser a rainha do ego, ainda estava a fim de pegar no pé dele. Felipe era o tipo de garoto que tinha o costume de ficar com uma garota, e depois deixar pra trás qualquer vestígio de relacionamento.
- Me escuta bem... – Stefany ainda não estava conformada – se acha que pode me tratar desse jeito... Fique sabendo que eu posso muito bem contar tudo pro diretor do acampamento. Ele vai saber que você ficou comigo no verão passado e vai te demitir por olhar para as meninas do acampamento com um olhar nada profissional.
Felipe riu.
- Eu não vou ser demitido, Stefany. Pra sua informação, eu sou o único instrutor de esportes radicais, e sem um instrutor, o acampamento vai ser cancelado, e se o acampamento for cancelado, vão ter que devolver o dinheiro, e eu tenho certeza que eles fariam qualquer coisa para não devolver o dinheiro das inscrições.  
- Você é um idiota. Um completo idiota.
- Minha mãe diz a mesma coisa de vez em quando, mas eu costumo relevar.
Stefany riu e acrescentou:
- Caso mude de ideia, eu estou sempre disponível pra você.
- Não quero te decepcionar, mas tenho total certeza de que não vou mudar de ideia. Como você mesma já disse, preciso me tornar um profissional sério. E aí, vai pular hoje ou quer que eu fique velho de tanto esperar?
- Vai se lascar! – gritou Stefany, indo embora revoltada e desistindo completamente de pular do penhasco.
- Algum problema, Felipe? – perguntou a monitora ruiva, que escutara a exclamação da garota a consideráveis metros dali.
- Não, nenhum... Essas adolescentes de hoje em dia são muito temperamentais.
A monitora olhou para ele levemente desconfiada, mas em seguida se afastou e continuou a vigiar os campistas tediosamente. 
Quando a vez de Júlia finalmente chegou, ela estava radiante de expectativa.
- É um prazer ver você novamente, princesa. – disse Felipe.  Júlia revirou os olhos.
- Você é completamente louco! 
- É... Estou começando a achar que todas as garotas do mundo armaram um complô contra mim, hoje.
- Por que você não me disse que era o instrutor? – perguntou Júlia, indignada.
- Porque eu queria conhecer suas reações de surpresa e revolta. – falou ele, tranquilamente. – E, se você quer saber, elas são bem previsíveis.
- Escuta aqui...
- Não adianta, Júlia. – ele interrompeu – Não adianta fingir que não está interessada por mim.
- Eu... É claro que não! Pra mim, você não passa de um estranho. Ou melhor, uma criatura insignificante que eu tive a infelicidade de conhecer, e que usa como forma de diversão garotas as quais deveria instruir, provando que não tem o menor profissionalismo.
- Quê? Olha, eu adoraria ter prestado atenção no seu discurso, mas...
- Será que dá pra eu colocar esse equipamento e pular do penhasco logo? A sua voz me irrita.
Felipe riu e, depois de prender o tornozelo de Júlia à corda elástica, disse:
- Vai nessa.
Júlia deu passos lentos e silenciosos até a beira do penhasco. Olhou para a imensidão que se estendia metros abaixo.
- Se estiver com medo... Não precisa fazer isso. – disse Felipe, com voz baixa e suave.
- Medo? È claro que não! Esperei minha vida inteira por esse momento. – protestou Júlia.
- Pois pra mim, parece que você está morrendo de medo. Duvido que você pule.
- Como você consegue ser tão irritante?
- As garotas que me chamam de irritante são as primeiras a ficarem loucas por mim. E no seu caso, não vai ser diferente, Júlia.
Júlia ficou vermelha de raiva. Quem ele achava que era, afinal?
Um segundo depois, Felipe sentiu um forte e sonoro tapa acertar em cheio o seu rosto. Mas quando olhou em volta, a garota que havia batido nele não estava mais lá. Júlia estava em queda livre, sentindo a adrenalina invadir suas veias, em um momento fantástico.

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